A realidade do verão: entre promessas e sestas

Crónica por Ana Freire

Sabem aquele final mágico de julho, quando parece que ainda temos todo o verão pela frente, cheio de promessas e resoluções?

Aquele momento: este ano é que vai ser! Nas férias, vou finalmente arrumar a arrecadação, pôr ordem no escritório, começar a correr (quem nunca?), ler mais um livro ou dois e, claro, experimentar aquela receita nova que vi na internet.

A lista é interminável, mas tudo parece possível — ainda temos tempo. Ou, pelo menos, queremos acreditar nisso.

O problema começa logo. A arte de adiar, essa tentação irresistível. “Amanhã começo”, repetimos para nós mesmos, na manhã preguiçosa de sol. “Depois do almoço, arrumo o armário.” E lá vai o dia escorrendo entre um café, uma conversa ao telefone, o almoço que se arrasta mais do que esperávamos e, claro, a sesta estratégica para fugir ao calor que aumenta a cada minuto. As pequenas desculpas vão-se acumulando, quase como se fossem velhas amigas nossas. Antes que percebamos, a lista que antes parecia um desafio organizado, torna-se uma comédia de adiamentos e promessas não cumpridas.

A culpa não é bem nossa. A preguiça — que já estava instalada há muito, admitamos — junta-se à eterna procrastinação.

Mas, no fundo, sabemos que o calor, as visitas inesperadas, os imprevistos e a tentação do sofá não ajudam nada. Quem consegue resistir a uma tarde sem compromissos, em que o único projeto do dia é não fazer nada?

Convenhamos, não fazer nada também tem o seu valor. Talvez seja até o projeto mais importante de todos. Afinal, é nesse espaço que recuperamos energias, que refletimos sobre a vida ou, quem sabe, simplesmente nos oferecemos o direito de não fazer nada — e isso, por si só, já nos diz muito sobre o que precisamos. O verão é esse espaço de leveza que nos permite parar e respirar, sem pressa.

Ainda assim, vamos manter a esperança! Agosto ainda não acabou e, sim, o ano tem muitos meses pela frente para concretizar todas aquelas pequenas tarefas que continuam à espera. Talvez a arrecadação possa esperar mais uns dias.

Talvez o segredo não esteja em arrumar a arrecadação de uma vez por todas, mas em dar início às pequenas coisas que nos fazem sentir vivos. Quem sabe, em vez de adiar mais uma vez, começamos hoje — nem que seja apenas arrumar uma gaveta, dar um passeio pela rua ou sentar no sofá sem culpa. O verão passa a correr e, no fundo, são esses momentos simples que, ao olhar para trás, preenchem a verdadeira lista de coisas que realmente importam.

No fundo, o momento perfeito nunca chega. Mas, ao fim do dia, podemos sempre encontrar algo que faça de hoje o momento certo para começar.

“Convenhamos, não fazer nada também tem o seu valor. Talvez seja até o projeto mais importante de todos. Afinal, é nesse espaço que recuperamos energias, que refletimos sobre a vida ou, quem sabe, simplesmente nos oferecemos o direito de não fazer nada — e isso, por si só, já nos diz muito sobre o que precisamos. O verão é esse espaço de leveza que nos permite parar e respirar, sem pressa”