Miúdos hiperativos
Fábio Simões, psiquiatra
Setembro é sinónimo de regressos, o regresso ao trabalho, o regresso ao Outono e para muitos o regresso às aulas. Com o regresso às aulas a azáfama habitual com as rotinas, a compra dos manuais escolares, os novos colegas e professores, mas também surge a preocupação dos pais de como serão as notas dos seus filhos.
Num outro dia enquanto esperava, impacientemente, numa fila ouvi atenciosamente duas mães preocupadas discutirem “este ano vou por o Rodrigo em explicações, aquele miúdo não presta atenção nenhuma às aulas, está sempre na lua”, disse uma das senhoras, enquanto a outra lhe respondeu “isso é do feitio dele, há miúdos assim, sempre distraídos, isso depois passa-lhe”.
Ora aproveitando a deixa, venho-vos escrever sobre uma doença de nome difícil, mas com a qual gostaria que ficassem um pouco mais familiarizados, a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA). É uma doença do neurodesenvolvimento complexa e que surge na infância ou adolescência e que afeta tanto rapazes como raparigas e que se caracteriza por sintomas de falta de atenção, hiperatividade e impulsividade. Tais sintomas podem perfeitamente passar despercebidos a pais e professores e serem vistos como “mau comportamento”, “falta de educação” e prejudicar gravemente o rendimento das crianças na escola, na sua vida social e familiar.
Assim, há vários sinais que podem ajudar os pais e professores a ajudar a identificar esta doença e sinalizar as crianças e adolescentes para serem observados por um profissional de saúde competente na área. Os três sintomas cardinais são: falta de atenção que muitas vezes faz parecer a criança “estar no mundo da lua”, ter dificuldades em seguir instruções e terminar tarefas escolares com erros por desatenção; hiperatividade que se manifesta por a criança estar constantemente a movimentar, inquietude na sala de aula e ter dificuldade em brincar ou realizar atividades tranquilas, e impulsividade sendo que a criança interrompe conversas, responde antes de ouvir a pergunta completa ou tem dificuldade em esperar pela sua vez em atividades. É importante notar que todos os comportamentos descritos anteriormente devem ser observados em diferentes contextos (casa, escola, restaurantes, gabinetes médicos, etc.) e por períodos prolongados de tempo. Daí ser de grande importância a partilha entre pais e professores para tentar identificar crianças em risco.
Quando não tratada, a PHDA pode levar a dificuldades na escola, problemas de auto-estima e até mesmo ao aparecimento de outras doenças como depressão ou ansiedade. Um diagnóstico precoce da PHDA pode ter um impacto muito positivo na vida das crianças e adolescentes através da implementação de estratégias eficazes entre as quais destaco: adaptações na sala de aula, terapia comportamental, intervenção médica e educação parental e escolar.
Em jeito de conclusão, importa sublinhar que a PHDA se diagnosticada e tratada adequadamente pode permitir às crianças e aos adolescentes viver uma vida plena e gratificante. A constante sensibilização da nossa comunidade para se manter atenta às crianças é fundamental para as ajudar a atingir todo o seu potencial. Neste papel destacam-se os pais e professores enquanto agentes de vigilância e educação dos mais pequenos.
Que o mês de setembro para além de um regresso contenha também em si uma oportunidade de recomeçar.